A Missa dos Mortos

A Missa dos Mortos
A missa dos mortos é uma das lendas mais tradicionais do Brasil. Existe um registro muito popular de fatos dessa natureza que aconteceram na Cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais, no começo do século XX, por volta de 1900. O caso todo ocorreu numa pequena Igreja que ficava ao lado de um cemitério, e esta era a Igreja de Nossa Senhora das Mercês de Cima.

De todas as coisas,  porém,  capazes  de arrepiar cabelo, e que ouvi em minha infância ouro- pretana,  nenhuma  tão  tremenda  como  a  Missa  dos Mortos, na Igreja das Mercês de Cima.

Quem m'a contou é pessoa conhecida em toda a cidade  de  Ouro  Preto,  e  exercia  funções incompatíveis  com  o  uso  da  falsidade  em  suas informações.

Foi  João  Leite,  o  saudoso  João  Leite,  pardo, miudinho,  anguloso,  sempre  montado  em  seu cavalinho  branco,  minúscula  montaria  de  hábitos austeros,  que  se  contentava  de  viver  da  escassa relva do adro da Igreja.

Seria  possível  que  uma  pessoa  estimável  e honesta como João Leite, sacristão de confiança de uma  irmandade,  zelador  de  um  templo,  tivesse coragem  de  depois  de  pregar  uma  mentira envolvendo  mortos  respeitáveis,  fosse tranquilamente  dormir  na  sacristia,  tendo  ao  lado um cemitério?

Tenho  dúvidas.  João  Leite  era  ele  próprio  uma figura  mista,  metade  deste  mundo,  metade  do outro.

Suas  origens  eram  misteriosas.  Foi  enjeitado, com  horas  de  nascido,  à  porta  da  Santa  Casa,  em época que não se sabe. Não se sabe, ainda, quando começou a funcionar como sacristão das Mercês. As mais  velhas  pessoas  da  cidade  já  o  conheciam desde  criança,  nesse  mister,  com  a  mesma  cara, sempre com o mesmo cavalinho branco.

Quando  alguém  indagava  de  João  Leite  suas origens  ou  o  tempo  que  servia  Nossa  Senhora  das Mercês,  em  sua  Igreja,  João  Leite  sorria  e  não respondia  nada  Um  belo  dia,  há  alguns  anos,  foi encontrado  morto  diante  do  altar-mor,  deitado  no chão,  com  as  mãos  sobre  o  peito,  arrumadinho como se estivesse dentro de um caixão. O cavalinho branco  sumiu  sem  que  dele  ninguém  desse notícias.

Pois João Leite, segundo narrativa que lhe ouvi, já lá vão mais de trinta anos, assistiu a uma Missa dos Mortos.

Morando  na  sacristia  do  templo  cuja  conserva lhe  era  confiada,  achava-se  recolhido  altas  horas da noite, quando ouviu bulha na capela.

A  noite  era  fria  e  João  Leite  estava  com  a cabeça  coberta  para  esquentar-se  melhor. Descobriu-a e abrindo os olhos viu claridade.

Seriam  ladrões?  Mas  a  Igreja  era  pobre  e qualquer  ladrão,  por  mais  estúpido  que  fosse, saberia que a Igreja das Mercês, sendo paupérrima, não  dispunha  de  prataria,  de  qualquer  outra  coisa de  valor  mercantil.  Enfim,  podia  ser,  raciocinou João Leite.

Estava  nessa  dúvida  quando  ouviu  sussurrado por  vozes  cavas  em  coro,  o  "Deus  vos  salve"  do começo da ladainha.

Ergueu-se e foi resolutamente pelo corredor até a  porta  que  dá  para  a  nave.  A  Igreja  estava  toda iluminada,  altares,  lustres;  e  completamente  cheia de fiéis.

No  altar-mor,  um  sacerdote  paramentado celebrava missa.

João  Leite  estranhou  a  nuca  do  padre,  muito branca,  não  se  lembrando  de  calvície  tão  completa no clero de Ouro Preto.

Os fiéis que enchiam a nave trajavam todos de preto,  e  entre  eles  alguns  de  cogulas,  e  algumas senhoras  com  o  hábito  das  Mercês;  todos  de cabeças baixas.

Quando o Padre celebrante se voltou para dizer o  Dominus  Vobiscum,  João  Leite  verificou  que  era uma  simples  caveira  que  ele  tinha  em  lugar  da cabeça.

Assustou-se,  e  nesse  momento  reparando  nos assistentes,  agora  de  pé,  viu  que  também  eles  não eram mais do que esqueletos vestidos.

Procurou  logo  afastar-se  dali,  e,  caminhando, deu  com  a  porta  que  deitava  para  o  cemitério completamente escancarada.

O  melhor  que  tinha  a  fazer,  fez.  Recolheu-se  à cama,  cobriu  a  cabeça,  transido  de  medo,  e  ficou quietinho  ouvindo  o  sussurro  das  vozes  orando,  o tinir  da  campainha  na  "Consagração"  e  no  Domine nom  sum  dignus,  até  que  voltou  de  novo  o  pesado silêncio das frias noites de Vila Rica.

Informações Complementares sobre a Missa dos Mortos

Nomes comuns: Missa das Almas, Missa das Almas Penadas.

Origem Provável: É sem dúvida originária da Europa. Em Portugal e Espanha, por volta da idade média, já se conheciam lendas com estas. Os romanos antigos acreditavam que os fantasmas dos parentes mortos se reuniam de tempos em tempos. Assim, eles, como também os Mouros espanhóis, celebravam a Festa dos Mortos. O objetivo era espantar os fantasmas errantes dos antepassados. Em Portugal é conhecida como "A Missa das Almas", e na Espanha como "La Misa de las Animas".

No caso brasileiro, é uma lenda muito comum em todo interior do país, embora seja citada como primeiramente relatada em Ouro Preto, Minas Gerais, na Igreja de Nossa Senhora das Mercês de Cima.

Também em Minas Gerais, na cidade de São João Del Rei, na Matriz de N. S. do Pilar, existe um relato semelhante. Nesse caso, aconteceu com uma viúva, moradora do lugar. Ela teria assistido a uma dessas missas e perdeu a noção do tempo. Quando o sino bateu doze vezes, à meia-noite, tudo desapareceu ficando ela sozinha completamente desorientada, e imaginando se tudo aquilo não passara de um sonho, daqueles que parecem a mais pura realidade.

De acordo com a crença de alguns, a pessoa que presencia uma dessas missas, está perto de morrer ou seria um aviso de que vai morrer alguém conhecido dela. Já outros afirmam que é um sinal de longevidade.

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